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Olhos escuros encontram claros com incerteza e abalo. Há uma pergunta no ar, mas ninguém consegue compreendê-la o bastante para traduzi-la em palavras. Não se sabe o que fazer; você sente que um abraço seria íntimo demais para o que vocês se tornaram, enquanto um sorriso seria falso demais, considerando como você se sente.
Mas, como você se sente?
A situação é estranha, inimaginável e, ainda assim, compreensível.
O mundo não é um lugar tão grande assim e você ainda se lembra de descrições precoces sobre crescer e como vocês sempre tiveram escolhas parecidas. Você também se lembra de detestar a maneira como as escolhas dela sempre pareciam querer superar as suas.
As lembranças ruins não estão perdidas.

Faz anos que vocês não se vêem, você percebe enquanto franze as sobrancelhas daquela maneira que sempre explicita sua confusão.
Não foi algo que fez falta, já que a amizade já não existia anos antes da separação definitiva – ou que parecia definitiva para duas ex-amigas de doze anos de idade. Ainda naquela época, porém, houvera o desconforto da indiferença que não deixa claro como alguém deveria se portar diante de uma conclusão tão precipitada.
Durante os anos de separação, você se convencera que a odiava.
(Traíra, desertora, falsa.)
Nunca dera razões para o abandono, mas tal ausência não impedira a ocorrência. Ignorada, irritada, você sente a injustiça mais do que sente a sua própria mágoa. E, no fim, enquanto você olha nos olhos daquela antiga intimidade quebrada, você percebe que é isso.
Você não tem raiva, tem mágoa.
E talvez sempre tenha. Os machucados psicológicos jovens parecem ser sempre os mais difíceis de curar totalmente, ao contrário das feridas fisiológicas. Você não compreende o porquê, mas sabe – sente – que é verdade.
A vida ensina lições e você aprende a se proteger, a aceitar, a não tomar tantos riscos. Quanto mais velha, mais dura.
(Que triste, que triste.)
Em toda a sua dureza e maturidade, é assustador como esse simples reencontro traz de volta toda a sua fragilidade de pré-adolescente. Ela traz de volta emoções fortes demais para serem contidas por sorrisos polidos e a dor de cabeça que é se sentir inseguro sobre tudo e todos.
Ela acena de forma desajeitada e você pisca, incrédula, só então percebendo que ela se sente tão desconfortável quanto você. Isso é reconfortante, porque lhe faz perceber que vocês cresceram e que tudo mudou. Você a perdoa.
(Mas não esquece.)
Acenando de volta, as duas se separam, afastando-se do passado e voltando a ser o seu eu presente. A fila de dominós desenfreados em sua mente, que são esses perturbados pensamentos de inadequação, é rompida.
O último dominó atinge o nada com um barulho surdo.

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